sexta-feira

Mandalas, cores e dia-a-dia







Mandalas, cores e cotidiano

Essa experiência foi desenvolvida com alunos da EJA durante o primeiro semestre de 2007 na Escola Municipal Hélio Pellegrino, localizada na região norte da cidade de Belo Horizonte. A proposta apresentada aos alunos teve, inicialmente, como objetivo a pesquisa sobre cores, a simulação de mistura de cores e a criação de composições que explorasse as relações entre as cores. As primeiras aulas constituíram-se de desenhos de observação e de criação, experimentações de composições figurativas e abstratas criadas no caderno de desenho comum que cada aluno possuía. Os que não possuíam o caderno desenhavam em folhas de papel sulfite tamanho ofício. Livros de arte foram apresentados aos alunos, com imagens de obras abstratas e figurativas nas quais ficava evidenciada a exploração das cores por artistas como Juan Miró, Piet Modrian e Alfredo Volpi. Buscando proporcionar uma experiência e aprendizado mais significativo para os alunos, foi utilizado também o computador e ambientes da web para pesquisa e simulação de misturas de cores.
O primeiro site acessado para a simulação de cores foi o Rede Interativa Virtual de Educação, da Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação, que elabora conteúdos pedagógicos digitais na forma de objetos de aprendizagem e os disponibiliza na web. Os objetos de aprendizagem são compreendidos como quaisquer recursos que possam ser utilizados para dar suporte à aprendizagem. O site possui os programas denominados cor luz e cores, produzidos com o objetivo de informar conceitos sobre cor luz e cor pigmento e também para manipular, comparar e fazer a formação das cores na tela do computador.
A utilização dos ambientes proporciona uma aula dinâmica, com tecnologia que permite atividades interativas através de simulações e algumas animações. Os conteúdos estimulam o pensamento crítico e o raciocínio dos alunos porque permitem a interação com as ferramentas no ambiente para simular a criação de um disco de cores e experimentar combinações para a formação das cores desejadas. O download dos programas pode ser feito no site e há também um guia para o professor, com sugestões de uso.
Um dos alunos, após acessar o site e ver o disco de cores na tela do computador disse: Podíamos fazer umas mandalas! Com isso ele queria dizer que gostaria de criar um desenho de mandala em um suporte físico, queria experimentar criar o desenho sobre papel. Essa sugestão foi apresentada para os outros alunos - de outras turmas também - mas a maioria não sabia o que significava mandala. Alguns arriscaram palpites: Foi uma novela que passou na televisão!, É coisa de macumba!, É um desenho redondo!
Foi contextualizado que a produção de mandalas poderia ser um bom exercício para explorar a composição de formas abstratas e para a aplicação da pesquisa sobre cores. Mas era um desenho que possuía uma simbologia envolvida, que a sua construção é normalmente ligada a uma forma de meditação, que o processo de produção é lento e que, apesar de estar presente em muitas culturas, o mandala não faz parte de uma manifestação artística em um período específico na historia da arte. Diante do conhecimento limitado que a maioria dos alunos possuía sobre o tema e da manifestação de vontade de aprender o significado e experimentar criar um desenho, partiu-se então para a experiência de pesquisa e para o exercício de composições de mandalas. Ficou combinado que seria um projeto cuja culminância seria a exposição, na escola, dos trabalhos criados. No início alguns alunos, principalmente os das séries iniciais, em processo de alfabetização, achavam que não seriam capazes de criar o desenho.
Muitos dos desenhos de mandala que se vê com certa frequência em muitas escolas de ensino fundamental são folhas impressas, com formas repetidas, para o aluno colorir. Foi incluída, então, nas atividades, a pesquisa sobre mandala, a sua origem, o seu significado e o acesso a imagens de mandalas e ambientes para simulação de criação de mandalas, associada à pesquisa de cores.6
Para o exercício de desenho em papel algumas regras foram estabelecidas: a) o desenho deveria ser inventado, não era permitido fazer cópias e foi estimulado, prioritariamente, o uso de formas e texturas percebidas no dia-a-dia: formas geométricas, presentes na própria casa, nos detalhes da arquitetura, nas cerâmicas dos prédios, nos desenhos nas embalagens, nas roupas, na mídia impressa etc. c) Era preciso criar ao menos dois desenhos no caderno, como exercício, e o desenho selecionado seria feito definitivamente em papel com gramatura maior, tipo papel cartão e em tamanho maior. d) Para ampliar as possibilidades de realização do projeto foi permitido criar composições também com desenhos figurativos, de imagens percebidas no cotidiano ou através de consulta à memória, de situações ou fatos relevantes vivenciados anteriormente que pudessem ser contados através de uma imagem. e) As cores deveriam ser realizadas somente com o uso de lápis de cor.
No começo os desenhos feitos eram rígidos, sem muita criatividade. Com o uso da internet e com o estímulo da percepção atenta aos elementos e formas do cotidiano os desenhos começaram a apresentar uma qualidade muito superior e a produção tornou-se mais profícua e variada, com trabalhos mais criativos e composições inusitadas. Exemplos como imagens de flores de uma toalha de mesa eram levadas para a composição do desenho; em outro caso, o formato do ralo do banheiro foi o ponto de partida para a criação do mandala e também desenhos criados a partir de imagens percebidas mentalmente, com o uso da imaginação na combinação de idéias etc., conforme relato dos próprios alunos.
Da associação com a vida cotidiana de cada um sugiram desenhos inusitados: Meu desenho eu imaginei quando tava tomando banho, é o ralo do banheiro! Eu desenhei um aquário! Eu desenhei uma bola! Meu desenho surgiu de um ovo, na hora que tava fritando! Alguns expressaram, através do desenho, preocupação com o meio ambiente. Outros revelaram a importância da arte, como o depoimento de uma aluna, gravado em vídeo: A arte pra mim, eu acho que está em tudo. Ela faz parte da nossa vida, do nosso cotidiano. A gente vê arte na casa da gente, nas coisas, na rua, no nosso corpo. Nosso próprio corpo é uma arte! O depoimento revelou, de forma surpreendente, uma interpretação madura sobre a importância da arte na sociedade e também do ensino de Arte na escola.
Buscar percepções e relações entre as cores e formas do cotidiano ajudou no desenvolvimento da capacidade criadora dos alunos e também no desenvolvimento perceptivo e crítico. Em todas as etapas houve envolvimento, pesquisa, experimentação, contextualização e julgamento de valores percebidos nos trabalhos e nos dos colegas. O uso da internet também proporcionou a efetivação de práticas de simulação de desenhos e mistura de cores que enriquecem a experiência e favorecem o encaminhamento das atividades desenvolvidas também na sala de aula e não só no laboratório de informática.
A exposição foi realizada no mês de junho de 2007. Houve o envolvimento da maioria dos alunos que criaram os desenhos de mandalas e muitos expressaram orgulho e autoconfiança depois do trabalho acabado e exposto na escola. A criação e as questões relacionadas às etapas de produção, a apreciação e reflexão sobre os próprios trabalhos e os dos colegas assim como apreciação de outras obras de arte - proporcionada principalmente pela pesquisa via internet - se constituíram nos conteúdos trabalhados durante o projeto.
O uso do computador e de recursos da internet também facilitou a construção do conhecimento sobre o tema pesquisado, sobre a arte e a diversidade de formas artísticas e se revelou numa ferramenta fundamental para o desenvolvimento do projeto.

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